Pelé é a medida de muitas comparações no futebol. O que se pode dizer então de Zizinho, o craque que o “Atleta do Século” reverenciava?
Thomaz Soares da Silva nasceu no município de São Gonçalo (RJ), em 14 de setembro de 1921. Em 1928, com o falecimento repentino do pai, a família Soares da Silva precisou mudar de planos.
Com os filhos para criar, Dona Eurídes decidiu mudar para Niterói. Colocou os guris em uma escola e arrumou emprego como enfermeira.
E o pequeno Thomazinho, ou Zizinho, como também era conhecido pelos amigos, foi crescendo com os livros debaixo dos braços e a costumeira bola de borracha nos pés.
Seu primeiro time foi o Carioca Football Club de São Gonçalo, agremiação onde o rapazola ganhou experiência nas categorias amadoras.
Precisando ajudar nas despesas da casa, Zizinho arrumou emprego no Lloyds Brasileiro. Foi assim que São Gonçalo ficou bem mais longe!
Zizinho então trocou de time e foi vestir a camisa do Byron de Niterói, uma equipe de muita torcida. Habilidoso e com facilidade para reter a bola nos pés, sua fama rapidamente atravessou o mapa da Baía de Guanabara.
Tamanha popularidade fez com que vários olheiros dos grandes times do Rio fossem de barca até Niterói.
Jogando como meia-direita do selecionado de Niterói, Zizinho enfrentou o Fluminense, em uma tarde onde o time das Laranjeiras parecia que liquidaria a peleja sem maiores dificuldades.
Com 2 gols relâmpagos, os rapazes do Fluminense não imaginavam que Zizinho fosse capaz de iniciar uma espetacular reação que levou o quadro de Niterói ao empate por 2×2.
Incentivado por amigos, Zizinho foi tentar a sorte no América, seu time de coração. Contudo, o treinador o achou franzino demais. Além disso, o América contava com várias opções naquela posição.
Decepcionado, Zizinho bateu nas portas do São Cristóvão. Durante o treino, uma pancada no joelho liquidou com qualquer pretensão!
Porém, o mocinho de Niterói não imaginava que seu destino já estava escrito nas anotações feitas por Otto Vieira, auxiliar técnico de Flávio Costa no Flamengo.
E assim, em 1939, Zizinho pegou novamente a barca de Niterói e foi até o Flamengo. Ficou pelas margens do gramado até ouvir do técnico Flávio Costa: “Chame o rapaz de Niterói”.
E naquele dia Zizinho jogou como um autêntico veterano. No encerramento do treino, Flávio Costa o mandou voltar.
E Zizinho logo encontrou seu lugar no time principal do Flamengo. Em pouco tempo, os torcedores, antes descrentes, foram esquecendo do fabuloso Leônidas da Silva!
Antecipando jogadas e organizando manobras de ataque como poucos, Zizinho brilhou na conquista do primeiro tricampeonato carioca do clube em 1942, 1943 e 1944.
Zizinho virou referência na Gávea, até o aparecimento do grande Vasco da Gama, o tão falado “Expresso da Vitória”.
Pela Seleção Brasileira, sua primeira participação aconteceu contra os argentinos em 18 de janeiro de 1942, compromisso válido pelo campeonato Sul-Americano disputado no Uruguai.
Em 1945, ao lado de Tesourinha, Heleno de Freitas, Jair e Ademir, Zizinho formou a linha ofensiva considerada pelos críticos a melhor formação do escrete em todos os tempos.
Enquanto o Flamengo buscava reencontrar o caminho dos títulos, Zizinho participou da conquista do campeonato Sul-Americano de 1949 pela Seleção Brasileira.
Cansado de assistir ao sucesso dos rivais, o presidente Dario de Mello Pinto resolveu montar um grande esquadrão para a temporada de 1950.
Dario de Mello Pinto contratou o goleiro Garcia da seleção paraguaia, além do zagueiro gaúcho Juvenal Amarijo. O próximo passo seria contar com os gols de Mariano, um promissor atacante com grande destaque no Bangu.
Assim, Dario de Mello Pinto marcou um almoço com o presidente do Bangu, Guilherme da Silveira Filho, também conhecido como “Silveirinha”.
Durante o encontro, Silveirinha até concordou em negociar Mariano, desde que Dario de Mello Pinto também abrisse mão de uma de suas estrelas. A negociação continuou, com o nome de vários jogadores do Flamengo que poderiam entrar na negociação.
No entanto, nenhum daqueles nomes agradou ao exigente cartola do Bangu, que irritado, reafirmou que só venderia o passe de Mariano em troca de uma verdadeira estrela.
Nesse momento, Dario de Mello Pinto projetou o que pensou ser uma “cartada de mestre”. Fixou bem alto o preço de Zizinho: 800.000 cruzeiros!
Esperando que o presidente do Bangu julgasse o valor elevado demais, Dario de Mello ouviu uma surpreendente resposta positiva: “Então está feito. Eu pago esse preço pelo Zizinho e você fica com o Mariano”.
Sem ter como voltar atrás diante de tantas testemunhas, o presidente do Flamengo ficou espremido na própria saia justa que criou. Sabia que estava cometendo um desatino imperdoável!
Assim chegava ao fim o período de Zizinho pelo Flamengo. Foram 318 partidas com 187 vitórias, 56 empates, 75 derrotas e 146 gols marcados. Os números foram publicados pelo Almanaque do Flamengo, dos autores Clóvis Martins e Roberto Assaf.
Aborrecido com o Flamengo, Zizinho mal teve tempo para ser apresentado aos torcedores. O clima na cidade era de grande euforia com o início da Copa do Mundo de 1950.
Com o pensamento voltado para o mundial, Zizinho esqueceu um pouco de sua transferência para o Bangu.
Depois da vitória por 4×0 contra o México na primeira partida da fase de grupos, um inesperado empate por 2×2 diante da Suíça no Pacaembu acendeu um sinal de alerta.
Em recuperação de uma contusão no joelho, Zizinho precisou entrar em campo no terceiro jogo decisivo do grupo contra a Iugoslávia.
Mesmo com o joelho inchado e envolto por ataduras úmidas de pomada, Zizinho fez uma grande partida e inclusive marcou o segundo gol da vitória por 2×0, resultado que carimbou o direito de disputar a próxima fase da competição.
Depois dos “passeios” contra Suécia e Espanha, o trágico revés para o Uruguai causou abalos psicológicos terríveis em Zizinho, que sempre evitava qualquer aproximação daqueles que insistiam em falar sobre o assunto.
Quando a prosa sobre o acontecimento era inevitável, Zizinho apenas sorria e repetia o famoso trecho da música – Preciso me encontrar – do cantor e compositor Cartola: “Deixe-me ir… preciso andar”.
Sem condições imediatas de voltar aos gramados, os dirigentes tiveram muito trabalho para fazer o abalado Zizinho desistir de abandonar o futebol.
Vice-campeão carioca de 1951, Zizinho ainda jogaria pela Seleção Brasileira no Sul-Americano de 1953 no Peru.
Todavia, em razão de desentendimentos com o chefe da delegação, José Lins do Rego, Zizinho acabou fechando o caminho para participar da Copa do Mundo de 1954, na Suíça.
Permaneceu em Moça Bonita” até o segundo semestre de 1957, mesmo ano em que também participou de um torneio internacional pelo Uberaba Sport Club.
A passagem pelo Bangu foi espetacular. Mas foi pelo São Paulo Futebol Clube que seu futebol voltou aos melhores dias. Com o comando do técnico Bella Guttmann, a experiência do veterano carioca foi determinante na conquista do campeonato paulista de 1957.
Zizinho continuou no Morumbi até 1958. Depois voltou ao Uberaba para em seguida defender o Audax Italiano do Chile até 1962, inclusive acumulando funções como treinador.
Orientou ainda o América (RJ), Bangu (RJ) e Vasco da Gama (RJ), além da Seleção Brasileira Olímpica. Fora do mundo da bola, Zizinho trabalhou como funcionário público até sua aposentadoria.
Thomaz Soares da Silva faleceu no dia 8 de fevereiro de 2002, vítima de problemas cardíacos. “Não há bola no mundo que seja indiferente ao Zizinho” – Nelson Rodrigues.
Créditos de imagens e informações para a criação do texto: revista Placar (por Dagomir Marquezi, Fausto Neto, Marcelo Rezende, Maria Helena Araújo, Ricardo Beliel, Ricardo Voltolini, Teixeira Heizer e Zeka Araújo), revista Álbum Rubro Negro, revista A Gazeta Esportiva Ilustrada, revista do Esporte, revista Esporte Ilustrado (por Charles Guimarães), revista Manchete Esportiva, revista O Cruzeiro, revista O Globo Sportivo, revista Tricolor, revista Vida do Crack, Jornal A Gazeta Esportiva, Jornal do Brasil, Jornal dos Sports, Jornal O Globo, bangu.net, campeoesdofutebol.com.br, flamengo.com.br, gazetaesportiva.net, globoesporte.globo.com, saopaulofc.net, site do Milton Neves, Almanaque do Flamengo – Clóvis Martins e Roberto Assaf, Livro: A História do Campeonato Paulista – André Fontenelle e Valmir Storti – Editora Publifolha, Livro: Dossiê 50 – Geneton Moraes Neto – Editora Objetiva.
Pedro Luiz Boscato disse:
Grande Mestre Ziza, ídolo de Pelé. Veterano que era, veio para o São Paulo em 1957 e foi um dos grandes nomes na conquista do Campeonato Paulista de 1957. Lembro de uma entrevista que Milton Neves fez com Julinho Botelho, o ex-ponteiro palmeirense disse que, claro, respeitando e não deixando de reconhecer Pelé como o Grande Rei, porém, fez questão de citar, se na época do Mestre Ziza tivesse o meio de comunicação que posteriormente teve, com certeza, ele seria mundialmente reconhecido e bem como os maiores da História do Futebol. Julinho sempre fez de frisar também, referindo-se a sua estréia no Palmeiras em 1958 quando retornou ao futebol brasileiro, vitória por 4×3 contra o São Paulo com Mestre Ziza, “com o Mestre Ziza”, Julinho sempre fez questão de explicar bem, “Vitória por 4×3 contra o São Paulo com Mestre Ziza”, Zizinho, realmente, foi também um dos maiores nomes na História do Futebol, para quem teve a sorte de vê-lo atuar.
Pedro Luiz Boscato disse:
Rogério,
é um blog muito bacana, muito interessante. Eu não conhecia, soubesse já tinha participado e com muito prazer antes. Calhou, agora recentemente, de um amigo me mandar por e-mail, a página do Julinho Botelho, aí que tomei conhecimento e comecei entrar. Parabéns, blog muito bonito, muito interessante, nele se aprende muito também. Parabéns mesmo, é um blog que tem credibilidade, blog honesto, cita, inclusive, as fontes que utiliza, nem todos fazem assim.
Abs.,
Pedro Luiz Boscato
Sérgio Oliveira da Silva disse:
Sérgio Oliveira da Silva – Cataguases-(MG)
Tiveo privilégio e a alegria de conviver por pouco tempo com o Zizinho. Ele me considerava muito como amigo e torcedor. Um ser humano exemplar e futebolista sem igual até hoje. Pena que partiu assim tão cedo . . . . . .